Pelo fim da legislação “tamanho único” - por Claudio Bernardes




A vida acontece nas cidades. Gestores públicos e sociedade sempre têm como encontrar as soluções necessárias para os seus problemas. E é dessa forma que a maioria dos municípios se desenvolve em muitos países, em especial nos Estados Unidos, onde legislações próprias regulamentam o planejamento e o desenvolvimento urbano, atendendo apenas a diretrizes gerais ditadas pelos governos federal e estadual.

Essa autonomia vem garantindo importantes avanços, inclusive no campo da sustentabilidade. Se o município entende que é possível nas áreas urbanas haver construções próximas a rios, desde que adotadas medidas que garantam a preservação da qualidade das águas e repeitados os estudos hidrológicos, não há qualquer impedimento. Até porque a ocupação organizada contribui muito mais do que isolar a área e deixá-la à mercê de invasões. Além disso, a função da água no meio ambiente urbano cumpre outras finalidades, relacionadas à paisagem, potabilidade para consumo e utilização para transporte de carga e pessoas.

O respeito às características de cada cidade depende de leis locais. A experiência internacional, especialmente a norte-americana, deixa isso muito claro e é motivo de admiração – para não dizer inveja – por parte de nós, brasileiros.

Em Nova York, considera-se que a cidade e seus cidadãos igualmente precisam de proteção contra os desastres naturais. À luz dessa escolha, são adotadas medidas corretas com vistas à sustentabilidade, com novas tecnologias para prédios mais verdes, e tudo de forma equilibrada.

Essa proteção também ao ser urbano precisa ser considerada no Brasil e observada nos sistemas de aprovação ambiental, do uso do solo e no código de edificações, que deveriam ser específicos para cada localidade. Os gestores internacionais sabem que restrições descabidas só encarecem o preço final dos imóveis, prejudicando especialmente os mais pobres, e acabam não cumprindo sua função precípua.

Da Geórgia (EUA) veem outros ensinamentos importantes. Lá não há código florestal nas áreas urbanas, mas leis importantes para mananciais e espécies ameaçadas (flora e fauna). Naturalmente, nas zonas urbanas as pessoas têm de assumir a preservação, pois cidades são feitas para crescer de forma harmônica com o meio ambiente. A aprovação de projetos traz exigências para manutenção e criação de espaços verdes, mas sem restringir o desenvolvimento.

Em Chicago, por exemplo, a legislação estabelece que empreendimentos sustentáveis tenham vários tipos de incentivo, como rápida concessão de alvarás, descontos no IPTU e maior densidade construtiva, como se existisse uma “outorga onerosa verde”.

Há muitos outros exemplos que o Brasil pode adaptar para promover o bom desenvolvimento urbano. Mas é importante considerar que diretrizes federais e estaduais devem tratar dos objetivos de desempenho, e deixar o como fazer para as cidades. Até porque o bom urbanismo é a solução mais eficaz para a preservação do meio ambiente.

Aqui, as cidades não são donas de si. Como se fossem elas incapazes de dirigir o seu destino, têm de se submeter a regras ditadas. O projeto de revisão do Código Florestal – que inexplicavelmente avança sobre as regiões urbanizadas, criando obstáculos para sua operação – é um exemplo.

A proposta original ignorou que a ecologia urbana difere da ecologia rural. Criou uma série de obstáculos ao correto desenvolvimento dos municípios, engessando-os por completo ao não permitir intervenções básicas, como cruzar um córrego ou implantar tubulações para saneamento básico em áreas consideradas de preservação permanente.

As cidades brasileiras, obedecidas as diretrizes fundamentais necessárias, têm de reassumir sua autonomia e não podem mais aceitar “legislação tamanho único”. Insistir nesse modelo é fechar as portas para o cliente cidadão que vive em municípios de portes absolutamente diversificados. Mudar esse sistema não será tarefa fácil, mas é necessário.

* Cláudio Bernardes é vice-presidente do Secovi-SP e titular da Ingaí Incorporadora S/A.

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