Corações e mentes dos consumidores populares - por Marco Roza


Corações e mentes dos consumidores populares - por Marco Roza

Existe uma sequência consolidada, até agora pelo menos, entre a produção das mercadorias e seu consumo final. Produz-se a partir da percepção mais intuitiva do que pesquisada, das necessidades gerais. E se alinham a publicidade, o marketing e a distribuição para empurrar a mercadoria goela abaixo do consumidor fragilizado na sua necessidade e individualidade.

Um consumidor com o esôfago e o estômago já dilacerados mas que continua a ser obrigado a ajustar suas expectativas, gostos e hábitos culturais ao produto disponível.  E que compra sem a realização plena de sua condição emocional, cultural e social. Era assim até muito recentemente, no resto do mundo e, especialmente, no Brasil.

As mudanças de hábito de consumo, mesmo que não sejam ainda levadas a sério pelos fabricantes e anunciantes amadurecem, rapidamente, com o acesso às informações disponíveis através da internet e mídias convencionais.

E ao serem potencializadas pela comunicação direta dos telefones celulares e pelas redes vivenciais nos aglomerados urbanos transferem o poder de decisão de compra rapidamente para os corações e mentes dos novos consumidores.
No Brasil, são homens e mulheres que foram mantidos às margens do mercado há várias gerações e obrigados a consumir o que estava disponível. Mas que neste momento de transição se libertam das velhas imposições ao perceberem, intuitiva e coletivamente, que podem obrigar os produtos, marcas e serviços a se ajustarem aos seus desejos e sonhos. E, simultaneamente, às suas necessidades.

No caso brasileiro, se conscientizam de seu poder de compra por que têm alavancagem de sobra para fazer valer suas novas expectativas, pois acumulam  e diluem moeda estável em milhões de bolsos num mercado que consolida grande concorrência entre fornecedores locais e mundiais.

Os 30 milhões de novos consumidores populares, que chegaram ao mercado nos últimos seis anos, gastam um adicional superior a R$ 750 bilhões por ano. E têm à sua disposição uma variedade imensa de opções e preços, de design e qualidade final que podem ser conseguidos na loja ao lado ou do outro lado do globo, através dos computadores já instalados em suas residências. Ou buscados nos mercados paralelos, facilmente acessados em ruas e galerias especializadas.
Como toda mudança, os grandes grupos de consumidores percebem coletivamente seu novo poder de decisão. Estendem a vida útil do aparelho celular à espera de um modelo ajustado às suas expectativas, seja com a atual marca ou de um novo fabricante do outro lado do mundo.

Fazem o mesmo com o aparelho de TV, com o DVD, com a geladeira e com o laptop da família. É uma operação inversa que exercem em cima dos produtos que de tanto desrespeitar seus corações e mentes, foram “commoditizados” por serem facilmente substituíveis, sem prejuízo funcional, por novos equipamentos que pipocam no mercado.

São os novos consumidores, com suas novas atitudes, quem dão alma aos novos produtos, serviços e marcas disponíveis. São bolsos pendurados em corações e mentes que chegam aos milhões ao mercado interno brasileiro, que antes apenas viviam as expectativas de consumo do lado de fora das lojas ou como ouvintes ou telespectadores passivos dos anúncios que os bombardeavam.

Mas ainda é uma alma consumidora adicionada após a produção e distribuição.

Muito além da propaganda e do marketing que ainda insistem na função antiga de apenas ser coadjuvante na tradicional tarefa de empurrar as mercadorias.

Propaganda e marketing que atendem quem produz sem se ajustar, mesmo tendo condições técnicas para tanto, às expectativas, sonhos, hábitos sociais e culturais de quem sustenta toda a cadeia produtiva.

Surge, para quem aposta nestes novos consumidores, uma nova realidade que abre avenidas inteiras de oportunidades para marcas, produtos e serviços que queiram captar o que rola pelos seus corações e mentes. Especialmente, os cerca de 30 milhões que agora testam, enquanto se inserem, o mercado interno no Brasil.

São os consumidores populares, que trazem no bolso um caleidoscópio de emoções, de hábitos regionais e culturais, de histórias de vida, de experiências acumuladas e matizadas cotidianamente nas suas intensas vivências sociais nas periferias dos grandes centros, no ônibus e trens superlotados.

Gente pronta para ser sensibilizada por produtos e serviços que acreditem nas suas vontades, que respeitem seus sonhos, que se ajustem, desde a produção e distribuição, às suas individualidades.

Os grandes players do mercado se preocupam com esse ajuste. Mas adotam métodos antigos e obsoletos para ascultar o novo consumidor. Catalogar as estatísticas do que está sendo vendido é ainda submeter a indagação, através de pesquisas convencionais de mercado, aos parâmetros da produção e da distribuição.

Por exemplo, saber que 85% das mulheres da nova classe média compram o sabonete tal é uma informação que confirma, apenas, que deram certo as ações de produção e de distribuição forçada daquela marca.

Se existir interesse em saber mais é necessário avançar até os corações e mentes destas mulheres para descobrir, por exemplo, que elas só compram aquele sabonete por falta de opção. Ou descobrir, e aí residem as novas oportunidades, como elas transferem o que sentem com determinada marca para suas filhas. Como relatam para suas amigas o reforço da auto-estima que tal cosmético acrescenta ao seu dia-a-dia.

Há que se indagar também a qualidade de suas vontades. Será que gostariam de ter o mesmo produto, com preço equivalente, na forma líquida, com perfumes ajustados aos seus hábitos regionais e étnicos e, quem sabe, com a garantia de que foi produzido e distribuído sem prejudicar o meio ambiente?

Teremos, então, a oportunidade  de produzir e distribuir mercadorias ajustadas à alma dos novos consumidores. Mas, para chegar a este estágio, além da vontade de aproveitar novíssimos nichos, teremos que aprender a entender como se manifestam essa poderosa alma coletiva dos novos consumidores populares, que cada vez mais têm, de fato, o poder de compra em seus bolsos, afinados com seus corações e mentes.

 

* Marco Roza é diretor da Agência Consumidor Popular

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